Informativo III – covid-19: como a pandemia afeta o direito e a atividade jurisdicional

INFORMATIVO III – COVID-19: COMO A PANDEMIA AFETA O DIREITO E A ATIVIDADE JURISDICIONAL

 

A pandemia da COVID-19, causada por um novo tipo de corona vírus, tem gerado diversos impactos nos sistemas de saúde, econômico e jurídico dos países ao redor do mundo.

No Brasil, por exemplo, seguindo a declaração de Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), feita por meio da Portaria nº 188/2020 do Ministério da Saúde em 03 de fevereiro de 2020, foi instituído um Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da COVID-19 (Decreto n° 10.277/2020), estabelecidas medidas emergenciais para a aviação civil brasileira (MP 925/2020), bem como, dentre tantas outras medidas, reconhecido o Estado de Calamidade Pública (Decreto Legislativo n° 06/2020).

Em informativos anteriores (I e II), tratamos de assuntos extremamente sensíveis para o direito do trabalho e para o direito empresarial brasileiro, como a edição da Medida Provisória n° 927 de 22 de março de 2020, que trouxe diversas previsões relacionadas às relações de trabalho neste período atípico, e aplicação da Teoria da Imprevisão aos contratos que se mostrarem excessivamente onerosos.

Trataremos no presente informe, portanto, outros assuntos relevantes no âmbito do direito, tanto para pessoais físicas, quanto para pessoas jurídicas. A saber:

 

I.  FUNCIONAMENTO DA JUSTIÇA

No ápice da discussão acerca das medidas necessárias para o enfrentamento da pandemia, especialmente a partir do dia 13 de março, diversos tribunais brasileiros editaram comunicados ou resoluções dispondo sobre o seu funcionamento neste período.

Como o Brasil conta com mais de 90 tribunais, o Conselho Nacional de Justiça optou, em 19 de março de 2020, por editar uma resolução única (Resolução CNJ n° 613/2020) com o intuito de uniformizar o funcionamento dos tribunais de todo o país, estabelecendo, dentre outras medidas, (I) a suspensão do trabalho presencial de juízes, servidores, estagiários e demais colaboradores, (II) a suspensão do atendimento presencial de partes, advogados e demais interessados, (III) a suspensão dos prazos processuais até o dia 30 de abril de 2020.

Todavia, importante esclarecer que, ao contrário do que se pode ter imaginado, A JUSTIÇA NÃO ESTÁ PARALISADA.

Conforme prevê expressamente o art. 93, inciso XII, da Constituição Federal, “a atividade jurisdicional é ininterrupta”, o que significa dizer que, em qualquer hipótese, é assegurado o acesso à justiça, especialmente para questões urgentes, como o são a apreciação de medidas liminares e de antecipação de tutela de qualquer natureza.

No Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por exemplo, além de garantida a apreciação de matérias urgentes, restou estabelecido pelo Provimento n° 2549/2020 do Conselho Superior da Magistratura, o seguinte:

 

Art. 6º. No período de vigência do Sistema Remoto de Trabalho, as unidades judiciais manterão, remotamente, a execução de expedientes, como elaboração de decisões, sentenças e minutas.

 

Importante lembrar que, atualmente, a maior parte dos processos judiciais tramita por meio eletrônico, de modo que a possibilidade de movimentação dos autos processuais por advogados e magistrados encontra-se mantida.

Assim, a despeito do fato de estarem suspensos, em todo o país, o trabalho e o atendimento presencial nos fóruns e tribunais, a justiça permanece funcionando em regime de Plantão Ordinário (finais de semana e feriados) e tem funcionado, também, por meio de Plantão Extraordinário (meio de semana), estabelecendo-se, para a garantia da continuidade da prestação do serviço jurisdicional, o trabalho remoto de juízes e servidores, bem como garantido o atendimento de advogados, membros do Ministério Publico e da polícia judiciária, mesmo que por via remota.

 

II. PLANO DE SAÚDE

Na área do direito à saúde, foi editada a Resolução Normativa nº 453 de 12 de março de 2020 da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, que incluiu no rol de procedimentos de cobertura obrigatória dos planos de saúde a utilização de testes diagnósticos para infecção pelo Coronavírus, nos seguintes termos:

 

Art. 1º A presente Resolução altera a Resolução Normativa – RN nº 428, de 07 de novembro de 2017, que dispõe sobre o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde no âmbito da Saúde Suplementar, para regulamentar a utilização de testes diagnósticos para infecção pelo Coronavírus.

Art. 2º O Anexo I da RN nº 428, de 2017, passa a vigorar acrescido do seguinte item, “SARS-CoV-2 (CORONAVÍRUS COVID-19) – pesquisa por RT – PCR (com diretriz de utilização)”, conforme Anexo I desta Resolução.

Art. 3º O Anexo II da RN nº 428, de 2017, passa a vigorar acrescido dos itens, SARS-CoV-2  (CORONAVÍRUS  COVID-19)  –   PESQUISA  POR   RT-PCR cobertura obrigatória quando o paciente se enquadrar na definição de caso suspeito ou provável de doença pelo Coronavírus 2019 (COVID-19) definido pelo Ministério da Saúde, conforme Anexo II desta Resolução.

 

 O Ministério da Saúde, antes de haver sido declarado o estado de transmissão comunitária – o que foi feito somente em 20 de março de 2020, por meio da Portaria n° 454/2020 – definiu como caso suspeito e caso provável o seguinte:

 

  1. CASO SUSPEITO DE DOENÇA PELO CORONAVÍRUS 2019 (COVID-19) 

Situação 1 – VIAJANTE: pessoa que apresente febre E pelo menos um dos sinais ou sintomas respiratórios (tosse, dificuldade para respirar, produção de escarro, congestão nasal ou conjuntival, dificuldade para deglutir, dor de garganta, coriza, saturação de O2 < 95%, sinais de cianose, batimento de asa de nariz, tiragem intercostal e dispneia) E com histórico de viagem para país com transmissão sustentada OU área com transmissão local nos últimos 14 dias (figura 1); OU

Situação 2 – CONTATO PRÓXIMO: Pessoa que apresente febre OU pelo menos um sinal ou sintoma respiratório (tosse, dificuldade para respirar, produção de escarro, congestão nasal ou conjuntival, dificuldade para deglutir, dor de garganta, coriza, saturação de O2 < 95%, sinais de cianose, batimento de asa de nariz, tiragem intercostal e dispneia) E histórico de contato com caso suspeito ou confirmado para COVID-19, nos últimos 14 dias. 

 

  1. CASO PROVÁVEL DE DOENÇA PELO CORONAVÍRUS 2019 (COVID- 19)

 Situação 3 – CONTATO DOMICILIAR: Pessoa que manteve contato domiciliar com caso confirmado por COVID-19 nos últimos 14 dias E que apresente febre OU pelo menos um sinal ou sintoma respiratório (tosse, dificuldade para respirar, produção de escarro, congestão nasal ou conjuntival, dificuldade para deglutir, dor de garganta, coriza, saturação de O2 < 95%, sinais de cianose, batimento de asa de nariz, tiragem intercostal e dispneia). Nesta situação é importante observar a presença de outros sinais e sintomas como: fadiga, mialgia/artralgia, dor de cabeça, calafrios, manchas vermelhas pelo corpo, gânglios linfáticos aumentados, diarreia, náusea, vômito, desidratação e inapetência.1

 

Assim, entende-se que, apesar dos conceitos de paciente “suspeito” ou “provável”, que devem ser observados pelos profissionais da saúde no momento da prescrição médica, carecerem de atualização oficial, haja vista a constatação de transmissão comunitária do vírus e do condicionante previsto no artigo 3° da Resolução da ANS, havendo prescrição médica específica, a cobertura pelos planos de saúde do exame para constatação de infecção pelo Coronavírus é obrigatória, sujeitando-se as operadoras, na hipótese do não cumprimento, às medidas judiciais cabíveis, como o são as ações de obrigação de fazer e as ações indenizatórias, em caso de eventual prejuízo comprovado.

 

1 Disponível em: https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca#casossuspeito

 

III. PENSÃO ALIMENTÍCIA

Outro ponto que reclama atenção é o da possibilidade de que, a partir da diminuição de renda de patrões e empregados, de eventuais demissões ou mesmo da dificuldade enfrentada por autônomos durante o período de tensão econômica causado pela pandemia, mães e pais responsáveis por prestar alimentos aos seus filhos passem a não possuir mais condições de suportá-los no importe fixado.

Neste particular, é importante frisar que os alimentos são fixados considerando, especialmente, dois critérios: (I) a necessidade de quem os recebe e (II) a capacidade econômica de quem os presta, admitindo-se a alteração do valor inicialmente arbitrado na hipótese de sobrevirem mudanças na situação financeira de qualquer das partes.

É o que preveem a Lei de Alimentos (Lei n° 5.478/1968), em seu artigo 15, e o Código Civil, em seu artigo 1.699:

 

Art. 15. A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista, em face da modificação da situação financeira dos interessados.

Art. 1.699. Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo.

 

No entanto, é preciso se ater ao fato de que aludida modificação do valor inicialmente fixado NÃO SE DÁ DE FORMA AUTOMÁTICA. Tanto o responsável legal obrigado ao pagamento da prestação alimentícia, quanto o menor, que teve sua condição financeira sensivelmente alterada pelas consequências econômicas do COVID-19, devem apresentar um pedido judicial de revisão dos alimentos, comprovando de forma cabal a alteração da condição financeira que justifique a redução, majoração ou mesmo a exoneração do encargo alimentar.

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